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15 de nov. de 2009

Projeto Motikomi Especial: Jump Scout Caravan

pict_scoutYo!

Sei que a proposta dessa serie eh levar minha historia ateh a Shueisha, em Toquio, para um motikomi. Mas nao pude perder a chance de ir ao evento da Jump que aconteceu em Nagoya, pra levar meu trabalho incompleto.

 

Pois eh. Eu pensei muito, primeiro por que levar um projeto incompleto nao seria uma boa pra avaliacao. Depois, por que eu pensei que isso poderia me deixar desanimado com tudo, dependendo do resultado.

Passei o ultimo mes inteiro pensando nisso e soh decidi na semana passada. Na pior das hipoteses, eles podem ver meus desenhos a lapis e meu roteiro, e me preparar melhor para quando eu for pra Toquio. Definitivamente, eu nao podia perder essa chance.

Imaginei varias hipoteses, varias situacoes, e o que dizer em cada uma delas. Claro, pensei no que fazer no caso de um sucesso. Mas mais do que isso, pensei em me preparar pra qualquer critica que pudesse receber. Precisava ter algo pra devolver, ou pelo menos ficar conformado com meus erros e me preparar para melhorar.

Nagoya eh a capital de Aichi, fica a mais ou menos uma hora de Toyohashi, onde eu moro. Fui de trem, porque o local do evento ficava no proprio predio da estacao central de Nagoya. De carro, tem o transito caotico da cidade e o estacionamento, nao ia dar certo.

Mode Gakuen, no predio espiral. Chegando lah, antes de subir ao decimo andar do predio da Meitetsu, jah avistei tres pessoas do evento, dois vestidos com uma camiseta vermelha com o simbolo da Jump estampada. Isso sem contar em uns dois ou tres que se destacavam lah. O bairro em si eh bem chique, com lojas da Louis Vuitton, Channel, etc. Eh tambem onde fica o Mode Gakuen, uma escola de arte e animacao bem famosa, que em Nagoya, ocupa um predio em espiral que por si soh eh uma obra de arte. No geral as pessoas por lah sao do tipo que andam de Mercedes, ou senao aquele tipo bem comum entre estudantes de arte, com roupas excentricas (tem curso de moda), dificil ver o pessoalzinho das camisas xadrez e mochilinha.

No elevador, fui me preparando pra ouvir as criticas, fiquei pensando que em uma hora ou duas, me atenderiam. Um grande engano! Quando peguei a minha senha, era a de numero 104, com horario pra 16:45, seis horas depois do horario que eu cheguei! E haja pernada pela cidade, andei metade da cidade, soh no peh-dois! E eh estranho, mas nessas horas, eu nao conseguia pensar em nada pra passar o tempo. Comprei alguns mangas, mas nem li, andava nas lojas e soh olhava… Passar o tempo eh o pior de tudo!

Voltei ao predio com mais de duas horas sobrando. Pensei: vou ver as pessoas que jah passaram pelo motikomi, ver como tah o nivel. E olhar pessoas eh algo engracado.

ok, nao eh pra tanto, mas serio, tinha umas mais ou menos por ai! Talvez seja algo tipico da cidade. Se Toquio eh pop, Nagoya eh chique. E isso ficava bem claro no visual do lado feminino. A Jump jah deixou de ser uma revista tocada somente por autores homens, e isso fica bem claro nesses eventos. Um monte de garotas, todas vem vestidas, maquiadas, algumas completamente fora do perfil “mangagirl”. Elas pareciam ter errado o andar, ateh eu as ver com um pacote de folhas saindo da bolsa de marca.

Mas o que me deixou mais deslocado foi a media da idade! A maioria nao tinha nem vinte anos, tinha varios que nao pareciam nem estar no colegial ainda! E isso me fazia parecer o tiozao da turma! Mais pressao, claro!

Era estranho ver as pessoas que voltavam. A grande maioria estampava um desanimo incrivel, serio, de quase chorar. Ou eles eram ruim demais ou os editores nao estavam maneirando nas palavras. De uma forma ou de outra, isso nao parecia bom sinal. Nao vi nenhuma pessoa saindo com sorrisos ou mesmo um pouco tranquilo. Bem, nesses eventos, acho que nenhum editor espera que chova grandes talentos em sua mesa.

Chegou a minha vez. Fui levado do decimo para o oitavo andar. No decimo, eles soh faziam o cadastro, de resto, usavam as salas de exibicao para outro evento, o Jump Anime Tour. Na verdade, parecia um labirinto, por que depois de irmos ao oitavo, seguimos por uma porta e subimos uma outra escada, onde dava pra ouvir sons de um capitulo de Naruto que eu nao lembro de ter visto. No topo dessa escada, tinham varias salas, que se pareciam mais com quartinhos de quatro tatame, como os do Tokiwa-sou, onde Tezuka e varios grandes autores da era de ouro do manga criaram seus sucessos. Nao deve ter sido proposital, mas valeu a referencia. Umas cinco salas eram da Jump, as salas do fundo, umas duas, eram da Square.

Esperei a minha vez, sentado num banco. Dava pra ouvir o som das salas, o comentarios dos editores. Eu estava entre duas salas e podia ouvir as duas. Em uma, um editor meio gordo, de oculos, explicava pra uma menina com cuidado, tudo o que sua historia nao tinha de bom, o que poderia mudar. Pensei, eh isso que eu quero! Ouvindo bem, deu pra perceber que ele perguntava por que o personagem principal aprendia kung-fu… Epa! Seria algo contra o estilo chines? Mal sinal para o meu Kung-Fu Baby Gu.

Na outra sala, um cara mais sossegado, falando pouco, virando as paginas muito rapido. Explicou em poucas palavras, e apesar de nao ser rude, parecia claramente desinteressado. Mal sinal, novamente.

Claro, o cara sossegado acabou rapidinho e jah chamou o proximo. Olhei pros lados e percebi. Era eu!

Caramba, me dei mal, eu pensei. Sentei, e jah avisei que soh tinha o roteiro pronto, e algumas paginas desenhadas. Planejei finalizar uma pagina antes, mas nao deu. Como eu estou um tempo sem desenhar, nao to ainda cem por cento com a pena, e achei melhor soh finalizar depois de treinar o pulso um pouco. Melhor que levar um negocio ruim.

Acho que esse pensamento que eu tive antes, de que me dei mal na danca das cadeiras, acabou me deixando mais nervoso. Ele me deu um questionario simples pra preencher enquanto ele lia meu roteiro. Ou melhor, nao lia, naquela velocidade, ler meus garranchos eh impossivel! Na melhor das hipoteses, ele estava soh vendo o fluxo das paginas e tentando pescar a historia. As paginas desenhadas, ele nao viu nem uma por uma, folheou todas juntas.

Me dava branco em tudo que eu preenchia no questionario, meu endereco, telefone, mangas que eu curto, revistas que leio… Respondi o maximo possivel, mas acabei deixando incompleto varias partes, nao vinha nada!

Long Cut. O editor arrumou as paginas, folheou rapido elas e comecou a falar. “Falta realidade na sua historia”. Realidade? Era algo que eu nao esperava, ainda mais porque nao deve existir uma justificativa plausivel para um bebe recem nascido que luta kung-fu melhor que os adultos. E a Jump em si nao eh uma revista muito realista. Fiquei com essa duvida, mas esperei ele terminar.

“Seu personagem estah muito fraco. Um bebe que nao fala eh dificil de aproximar o leitor.” Essa foi uma bomba, porque o que eu mais considerava forte no roteiro era a personalidade do bebe e sua motivacao. Alias, ele criticou que a maior parte dos personagens nao tinha muito expressao, nao demonstrava ser um tipo de pessoa definido. Os unicos personagens que ele aprovou foram os dois pais e o rival, que tem ateh frase de efeito.

Tomei meu folego e comecei a perguntar de volta. Nao conseguia entender, realidade? Em uma historia de um bebe lutador de kung-fu?

O editor voltou as folhas e apontou pro comeco da historia. “Como eh que um bebe pode estar andando assim e chutando, porrando todo mundo? Nao importa que a resposta seja um pouco fantasiosa, mas voce nao pode deixar de explicar essas coisas”. Basicamente, ele me falou que a fantasia de sua historia precisa de uma explicacao, mesmo que ela tambem seja fantasiosa. Justo e compreensivel. Na historia, eu explico isso em dois quadros, em que um dos personagens comeca a falar sozinho, que genios assim aparecem as vezes, e voltando a razao, quando se pergunta “E por que eu to tentanto me convencer desse absurdo?” Ou seja, eu simplesmente aceitei como absurdo e pedi aos leitores pra relevarem isso.

Respondido, perguntei o que poderia ser feito pra reforcar o personagem. E ele me falou que eu deveria fazer ele mais velho. O principal era ele falar, pra poder ter mais expressao, reforcar sua personalidade com falas. Ele deu a dica de anotar toda frase legal que eu ler nos mangas e ver o que marca nelas. Mas na minha historia, se o bebe falar, eu perco o final dramatico, que eh exatamente o momento em que ele fala pela primeira vez.

One Piece, passo a passo O que pode ser feito entao eh incluir um personagem que crie identificacao. E ele citou o bebe de Belzebabu, eu tinha certeza que ele ia citar isso alguma hora! Disse que a historia pode ateh rolar no mesmo personagem, mas eu posso incluir um personagem narrador para dar proximidade com o publico e criar emocoes que possam ser transmitidas, de forma escrita.

No mais, ele disse que as cenas de acao estavam boas e eram o ponto forte da historia, mas que sem paginas finalizadas, nao dava pra dar um parecer definitivo. A historia era meu forte, mas na Jump, o personagem conta muito mais ponto.

Eu tinha tanta coisa pra perguntar, tanta coisa que eu queria a opiniao dele antes de finalizar as paginas, mas esqueci tudo! Minha cabeca ficou em branco e eu ficava tentando lembrar algo pra falar, mas nao veio.

Ao fim, ele me deu uma folha, onde se destacam os pontos fortes e fracos da minha historia. Prefiro ignorar aqui, porque seria chover no molhado. Fui lah somente com um roteiro e algumas paginas a lapis, ele criticou meus personagens e deixou claro a referencia a Belzebabu (e digo aqui: nao tem nada a ver, fora o bebe). Entao, pontos por estrutura de pagina, originalidade, personagem e arte, eu nao poderia ter. Tive duas marcas em historia e organizacao.

Alem da folhinha xerocada, ganhei um bloco de papel da Shueisha e uma revista, com paginas em tamanho real e comentarios dos artistas da Jump, alem de um passo a passo de uma pagina de One Piece, comentado pelo proprio Oda. Bem, a visita nao foi tao ruim, neh?

Premio de consolacao

Sai de lah pensando no que eu deveria fazer. Como poderia melhorar. E eh claro, eu nao poderia nem esbocar um sorriso, o que me fez lembrar das pessoas que eu via voltando da entrevista. Pensei em como aquilo me deixou nervoso e como eu poderia deixar os outros nervosos tambem. Nao custa nada pelo menos ficar aliviado. Passei por umas pessoas que ainda pareciam desoladas pelo resultado e elas me olhavam com outro olhar. Talvez fosse melhor ficar neutro mesmo.

No trem, fiquei o caminho todo pensando na minha historia, pagina por pagina, buscando solucoes para melhorar ela. E, nao vou mentir, pensei em desistir dela e fazer outra, ou desistir do motikomi em si. Mas isso nao seria o correto e eu mesmo nao poderia me perdoar se eu desistisse tao facil. Preciso melhorar, sempre.

Cheguei em casa, peguei aquela folhinha com minha nota, preenchido as pressas pelo editor e preguei na frente da minha mesa. Pra nao esquecer, nunca, nao que eu nao tive todas as notas maximas, mas que com uma historia incompleta, eu fui pro motikomi, recebi as criticas e nao desisti.

workspace

8 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Seu blog me faz sentir um pouquinho próximo do Japão! E este Projeto Motikomi é inspirador. Ainda não encontrei a motivação para levar meu sonho de fazer quadrinhos adiante (sou muito preguiçoso e desanimo facilmente), mas você parece já ter encontrado a sua, e está em um ambiente de possibilidades, portanto, não desista! Torço por você!

    P.S: Removi o comentário anterior por conta de um erro.

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  3. Acompanhar sua vida e ler Bakuman são grandes atrativos ;)

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  4. Sthefan, o negocio eh nao desistir. No Brasil, eh dificil falar isso pra alguem, porque voce nao pode falar pra alguem continuar tentando algo que nao existe. Mas se voce estiver preparado, quando aparecer a chance certa, fica mais facil investir. Quem sabe, nao eh?

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  5. Ola Fabio,

    Puxa! Ficou muito bom o post. Foi possivel se sentir na sua pele.

    Mas parece que a experiencia foi boa.

    Voce tah pensando realmente em incluir um narrador? Um personagem que acompanhe o bebe como uma consciencia (grilo falante) ou espirito?

    Um abraco e boa sorte.

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  6. Sónaboa Fábio?
    Cara, realmente sua experiência tem muito a nos dizer. É legal ver algo realmente palpável sobre esse mercado tão fascinante e funcional.

    Mas devo te dizer que concordo com o editor. Humanos se aproximam (de verdade) de humanos, e a fala nos quadrinhos é essencial, pois não temos o som das outras mídias. E personagens são o que realmente contam em uma história, se eles nao tiverem essa função respeitada, ela não anda, e o leitor se desapega, largando o gibi.
    Siga em frente! Não desista!

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  7. Oi Fabio, muito interessante a postagem, aprendi muita coisa lendo seu blog hoje. Essa valeu a experiencia, boa sorte na próxima vez!

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  8. ae fabio, poxa desde muito tempo acompanho vc em revistas e tudo mais, poxa cara... suas ideias são tao pouco ousadas... vc pode achar que se valer da historia é o mais importante, mas uma ideia chamativa combinada com sua habilidade de contar historia, cara isso sim é mangá.
    obrigado pelas informações, apesar de parecer um fanboy qualquer, eu levo mangá muito a serio, e amo isso. sei dos riscos e dificuldades, mas pretendo no futuro próximo me arriscar, como vc. ai no japão, e não vou desistir, com certeza suas informações me subiram em mais um degrau na infinita escada do conhecimento sobre mangás, obrigado e sorte;.

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